Os primórdios da aviação militar no Brasil

O Exército Brasileiro foi o primeiro a demonstrar interesse em atividades aeronáuticas para fins militares. Sob a inspiração do Mal. Hermes da Fonseca, procurou-se desenvolver a aerostação militar (uso de balões, estáticos, para fins de reconhecimento). O primeiro vôo em balão militar no Brasil, no dia 20 de maio de 1908, terminou em acidente, vindo a falecer o tripulante, Ten. Juventino Fernandes da Fonseca. Isso levou o Exército a não prosseguir com seus planos a respeito da aerostação.

Os primeiros vôos de aviões foram realizados no Brasil em 1910. Como inexistiam escolas de pilotagem no Brasil, aqueles militares que desejavam o brevê procuravam-nas em outros países. Assim, temos as figuras do 1º piloto militar brasileiro, Ten. Jorge Henrique Moller, da Marinha de Guerra, brevetado em 29 de abril de 1911 pela Escola Farman (França); e do 1º piloto do Exército Brasileiro, Ten. Ricardo João Kirk, brevetado em 22 de outubro de 1912, na França.

As primeiras escolas de aviação

No dia 14 de outubro de 1911, foi criado o Aero-Club Brasileiro, com a participação de vários entusiastas, tanto civis como militares; Alberto Santos-Dumont foi seu presidente honorário. O Aero-Club organiza de imediato uma campanha nacional, “Dêem Asas ao Brasil”, a fim de levantar fundos

“… para permitir a fundação de uma escola de aviação e dotar o nosso Exército e nossa Marinha com aparelhos de voar os mais modernos…”
A tarefa a que o Aero-Club se propôs a realizar foi bastante prejudicada, pelas dificuldades em se obter aviões, material de manutenção e, principalmente, instrutores de pilotagem e de mecânica aeronáutica. Já em 1912 o Ten. Kirk, sócio do Aero-Club, vai à França para adquirir equipamentos e tratar da filiação do Aero-Club à Federation Aeronautique Internationale, a fim de validar os brevês que fossem concedidos pelo Aero-Club no futuro.

Entretanto, enquanto o Ten. Kirk encontrava-se em França, um aviador italiano, Gian Felice Gino, chega ao Brasil; realiza uma série de demonstrações, inclusive uma no Rio de Janeiro, a pedido do Aero-Club, para auxiliar na campanha “Dêem Asas ao Brasil”. Junto com os seus compatriotas Vitorio Buccelli, Eduino Orione e Arturo Jona, forma a empresa Gino, Buccelli e Cia., com o objetivo de colocarem em funcionamento a Escola de Aviação do Aero-Club. Devido ao elevado patriotismo dos sócios do clube, a proposta não é aceita. A Gino, Buccelli e Cia. vai então oferecer seus préstimos ao Ministério da Guerra.

Como desfecho desses acontecimentos, temos a criação da Escola Brasileira de Aviação, primeira do gênero no Brasil, no dia 2 de fevereiro de 1914. Sob contrato com o Ministério da Guerra, a escola localizou-se no Campo dos Afonsos (ainda hoje sendo utilizado para fins aeronáuticos, sediando a Universidade da Força Aérea, a Base Aérea dos Afonsos e o Museu Aeroespacial).

A primeira turma da escola tinha 35 oficiais do Exército e 25 da Marinha. As atividades da escola foram, no entanto, de curta duração, pois já em junho de 1914 a Gino, Buccelli e Cia. resolveu suspender as operações, trazendo com isso incontáveis prejuízos ao desenvolvimento da aviação militar no Brasil. Com o fechamento da escola, suas instalações foram transferidas ao Aero-Club.

Temos também as atividades da Escola de Aviação da Força Pública de São Paulo, a qual foi criada em 1913. Tinha como fim dar uma superioridade ao Estado de São Paulo em caso de uma intervenção por parte de forças federais (as quais vinham ocorrendo em certo número na época). Suas atividades duraram apenas alguns meses, no entanto.

Frente aos avanços de outras Armadas, a Marinha de Guerra brasileira resolve, em 1916, criar o seu serviço de aviação. Já em 22 de agosto de 1914, havia sido criada a Escola de Submersíveis e Aviação, a qual aparentemente não chegou a ser organizada. Agora, no entanto, os momentos eram de crise, pois a Iª Guerra Mundial já durava três anos. O dia 23 de agosto de 1916 viu a criação da Escola de Aviação Naval – EAvN. Em novembro do mesmo ano foram incorporados à Esquadra três aerobotes Curtiss F. A escola formou inúmeros oficiais e sargentos, tanto da Marinha como do Exército (o qual ainda não tinha sua própria escola de aviação).

O pioneirismo no uso da aviação com fins militares

Entre 1911 e 1915, ocorreu a chamada Campanha do Contestado, uma conflagração envolvendo tropas do Exército, das Forças Públicas do Paraná e de Santa Catarina e um grupo de fanáticos religiosos. Esse conflito surgiu devido a uma questão fronteiriça entre aqueles dois estados. De tal situação serviu-se um fanático para arrebanhar moradores da região e formar um bando, bastante bem organizado, o qual atacava as forças federais e públicas em táticas de guerrilha. Estas, por conseguinte, necessitavam conhecer a localização dos rebeldes.

É aí que entra em cena o Ten. Kirk, o qual, juntamente com o civil Ernesto Darioli (contratado pelo Ministério da Guerra), realiza missões de reconhecimento, pilotando aviões Morane-Saulnier. Essa foi a primeira utilização da aviação em apoio a atividades militares realizada na América do Sul.

O Ten. Kirk vem a falecer no dia 1º de março de 1915, vítima de acidente enquanto desempenhava uma dessas missões.

A I Guerra Mundial

Em agosto de 1914, deflagrou-se na Europa um conflito que logo tomou proporções gigantescas, vindo a engolfar todo o mundo. De um lado, os Impérios Alemão e Austro-Húngaro; de outro, os Impérios Britânico, Francês e Russo. Outros países viriam a juntar-se ao conflito no seu decorrer, forçados a tanto por terem sido alvo de agressões, como por exemplo os Estados Unidos da América.

Assim foi também com o Brasil, o qual conseguiu manter a neutralidade até 1917. No dia 3 de abril de 1917, um submarino alemão torpedeou o navio mercante brasileiro “Paraná”, navegando próximo à costa francesa; tal ato levou ao rompimento das relações diplomáticas com o Império Alemão. Com o torpedeamento dos navios brasileiros “Tijuca”, “Macau”, “Tupi”, “Acari” e “Guaíba”, o Brasil declarou guerra àquele Império em 26 de outubro de 1917.

A participação brasileira durante o conflito refletiu-se no envio de navios da Marinha de Guerra à Dakar (noroeste da África), a chamada Divisão Naval em Operações de Guerra, para efetuar operações de proteção a comboios em uma área que se estendia pelo Atlântico de Dakar a Gibraltar.

No tocante à Aeronáutica, os seguintes desenvolvimentos ocorreram:

  • Oficiais do Exército e da Marinha foram enviados à Grã-Bretanha, em janeiro de 1918, a fim de receberem treinamento em pilotagem de aviões junto ao Royal Naval Air Service – RNAS (o antigo corpo aéreo da Real Marinha Britânica). Esses oficiais foram treinados nas estações aeronavais de Eastbourne, Lee-on-Solent e Calshot; dois oficiais faleceram nesse período devido a acidentes. Após o treinamento, aqueles oficiais desempenharam missões de guerra, integrando uma esquadrilha da então recém-criada Royal Air Force – RAF (Real Força Aérea Britânica), a qual contava com pilotos brasileiros, norte-americanos e britânicos.
  • Em março de 1918, a Escola de Aviação Naval recebe uma Missão Militar Americana. A EAvN recebeu 6 Curtiss HS-2 de patrulha, 2 F.B.A. de reconhecimento, 4 Curtiss F e 2 Standards de instrução. Um outro Curtiss F foi construído nas oficinas da Escola.
    Em fins de 1918 oficiais e praças da Marinha foram enviados à Itália para receberem instrução.

A Escola de Aviação Militar

Imediatamente após o Brasil ter declarado guerra ao Império Alemão, em função do torpedeamento de navios brasileiros, iniciaram-se tratativas para o envio de uma Missão Militar Francesa ao Brasil, a fim de modernizar o Exército. Devido a resistências ao que era visto como uma intromissão de uma nação estrangeira nos assuntos do Exército, optou-se pelo envio de uma pequena missão, cujo objetivo era o de prestar instrução aeronáutica ao Exército.

Com a chegada do pessoal francês ao Brasil em meados de 1918, iniciaram-se os preparativos para o treinamento de pessoal. Ao final do mesmo ano foi criado o Serviço de Aviação Militar do Exército. Em 29 de janeiro de 1919, foi criada a Escola de Aviação Militar – EAvM, para formar pilotos, observadores e mecânicos de aeronáutica. A EAvM foi inaugurada em 10 de julho e era equipada com aviões Sopwith Snipe, Morane-Saulnier, Bréguet 14A2 e Spad VII.

Desenvolvimento da Instrução Aeronáutica

Em abril de 1917, sargentos da Força Pública do Paraná promoveram uma campanha pública de arrecadação de fundos para a aquisição um avião para a Força; em 1918 foi adquirido um monoplano biplace Borel, o qual foi batizado com o nome de “Sargento”. Nesse mesmo ano foi criada a Escola Paranaense de Aviação, a qual infelizmente não formou pilotos, pela falta de instrutores, e acabou no esquecimento.

Em 1919, a Força Pública de São Paulo retoma as atividades aeronáuticas; no dia 9 de dezembro é reativada a Escola de Aviação, localizada no Campo de Marte. Um ex-instrutor norte-americano da Escola de Aviação Naval, Orton William Hoover, é contratado para dar a instrução. A escola operou inicialmente três aviões Oriolles e cinco Curtiss JN, e brevetou a primeira turma em 1º de agosto de 1920.

Já a Escola de Aviação Naval avançava a passos largos. No dia 15 de agosto de 1919, é realizado o primeiro vôo aeropostal da Marinha, inaugurando-se o Correio Aéreo da Esquadra, precursor do Correio Aéreo Naval. A EAvN adquire, em 1919, dois Farman F-41, quatro Curtiss N-9, dois Ansaldos ISV A, um Macchi M7 e cinco Macchi M9; em 1920, foram adquiridos aviões Avro 504K, bem como dois Farman F-51, quatro Curtiss N-9 e quatro Aeromarine; um Curtiss MF foi doado pelo governo norte-americano.

Bibliografia:

  1. “História Geral da Aeronáutica Brasileira”, V. 1, Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica, Rio de Janeiro, 1991.
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